samedi, juin 28, 2008

Para curar qualquer dor.

Para curar qualquer dor, como se cura qualquer ressaca: sonrisal limão, eno de laranja e muita água. Um banho gelado, que seja um balde de água fria nas idéias. As idéias, presas num emaranhado delas mesmas. A cabeça que, confusa, pede pra rever a cena, reouvir a notícia, porque ainda não assimilou tudo muito bem.

Para curar qualquer dor, grite, xingue, esbraveje, mande à merda. Ainda que silenciosamente. Sinta o gosto amargo na boca, aquele que seca e dá nojo, aquele que te faz desejar nunca ter chegado perto daquilo que deu origem à sua dor. Você sente nojo é de você. Você grita consigo, se xinga, esbraveja, se manda à merda. Vai à merda. Fica na merda.

Para curar qualquer dor, uma cerveja gelada. Um maço de cigarros, uma roda de amigos. Uma cachaça forte, numa mesa de bar. Bebida-analgésico. Bebida-perda-de-memória-recente. Olhando as bolinhas de gás que sobem naquele amarelo-ouro brilhante, tão bonito.. Para curar qualquer dor, não olhe pro céu, não é hora. Deixe que o primeiro clarear do dia te avise quando é tempo de voltar pra casa. Sozinho, na madrugada amiga, acolhedora, na noite com seus sortilégios. As ruas e lugares esvaziando, sobrando você, sobrando aqueles que saíram para curar suas dores. Sobrando somente a dor. Vinte e quatro cervejas, para curar qualquer dor.

Para curar qualquer dor, não tente entender. Não busque explicações satisfatórias, comprovações científicas, não procure no dicionário. Não procure em gavetas, portas, armários, lojas ou salões. Não está na janela, nem dentro da geladeira. Não queira entender. Não espere respostas na astrologia, não pense que vai cair do céu. E se só Deus sabe, não se daria o trabalho de te contar. Não apele pra macumba. Não fique remoendo.

Para curar qualquer dor, engula o choro. Seja homem. Vá pro canto se esconder, caso as lágrimas teimosas cismem em cair. Ninguém pode ver. Respire fundo, engula a seco, vai descer rasgando, mas se dê por satisfeito. Ou, pelos menos, finja. Finja simpatia. Force sorrisos, e se esforce para que saiam algo próximo a naturais. Isso, continue rindo esse sorriso quase natural pendurado no rosto, para curar qualquer dor. Seja fingidor.

Para curar qualquer dor, não pare. Não olhe pros lados, não tem ninguém. Não olhe pra trás. Como bicicleta, que só se equilibra em movimento, não pare. Não pense. Não pare para pensar.

Para curar qualquer dor, basta fechar os olhos, abrir os ouvidos, abrir o coração. Deixe o que é bom entrar como inspiração. Deixe a música penetrar como água, pelos poros da pele. Se esqueça, se largue, se abandone em algum lugar ou instante. Solte suas amarras, se solte. Permita-se. Dance. Para curar qualquer dor, a bossa de um repique e um pandeiro. Distraia-se no movimento, nos instrumentos, nos sorrisos, viaje no som.

Para curar qualquer dor, viaje. Pra longe, ou bem longe, ou pra perto, ou sem sair do lugar. Liberte o pensamento. Deixe o vento descabelar ou a brisa fazer cosquinha. Pode abrir os olhos já, e enxergar quanto o há na sua frente, não antes de olhar o quanto há dentro de você. O universo inteiro lá fora, o infinito particular aí dentro. Uma dor não é nada perto disso, nem você. Tá tudo tão perto... você é pequeno, pequenininho, insignificante. Você some no incomensurável. Suma.

Para curar qualquer dor, chore. Chore muito, abra o berreiro, bote pra fora a sua dor. Para curá-la, tem de haver ferida sangrando, tem que chorar. Chore tanto, até que você fique sem voz. Chore tanto, até que você fique fraco. Se dilacere, rasgue a roupa, arranque os cabelos. Chore alto, forte, intenso. Se despedace. Soluce. Fique com o rosto inchado. Fique com sono.

Para curar qualquer dor, durma. Durma feito criança. Durma feito pedra. Descanse, relaxe. Um banho quente, antes disso, para afagar o coração. Deite o rosto no travesseiro, e não se preocupe, amanhã você já não vai mais molhá-lo. Foi só um susto, criança. Se faça cafuné, se nine, e durma. Durma bem, durma com os anjos. Ao acordar, você vai lembrar que, como tudo na vida, as alegrias, o dinheiro, o onibus, o tempo, os amores, as pessoas, tudo, tudo passa. Ao acordar, toda dor passa, toda dor se esquece. Você se torna mais forte para poder doer mais, depois, poder curar qualquer coisa depois.

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E, de repente, eu abri os olhos, e ela não estava mais lá. Nem pra se despedir. A dor foi embora sem falar comigo. Chegou de susto, mas foi embora de mansinho, em absoluto silêncio.

lundi, juin 09, 2008

Milícia dos torturadores de Santo Antônio.

A segunda semana de junho é, digamos assim, uma semana meio tensa para as(os) solteiras(os), sejam elas(es) as(os) recém-solteiras(os) ou as(os) sempre-solteiras(os) de sempre. E, após muito debate numa roda de amigos, chegamos a conclusão de que não é por causa do dia dos namorados.. é por causa do dia de Santo Antônio!

Dia 12 junho é um dia comum, sempre foi. Data capitalista sem filosofia nem utilidade alguma, a não ser individar o pobre casal durante uns meses e enriquecer lojas, restaurantes, e até motéis. Data para comemorar o amor tinha que ser o aniversário do relacionamento. Ou melhor: o amor deveria ser comemorado todos os dias, e da melhor maneira possível (seja pelos pombinhos apaixonados encoleirados ou não). O respeito, o carinho, a sorte de ter alguém legal com quem dividir os momentos não deveria ter data marcada para ser celebrado.

O grande problema não está no dia 12 de junho, mas sim no TREZE! Este ano, mais ainda: SEXTA FEIRA TREZE! Dia de Santo Antônio. O santo casamenteiro. Crenças à parte, bem ou mal todo casal deve ter recebido um dedinho de ajuda dele. Menos a gente.

Temos uma sina com Santo Antônio que é impressionante! Moramos na travessa SANTO ANTÔNIO, o nome do nosso prédio é SANTO ANTÔNIO, e na nossa esquina tem a capela de SANTO ANTÔNIO. Com tantas coinscidências, por que ele esqueceu de nós?? Logo nós, que desde que nos entendemos por gente estamos lá, todo santo 13 de junho, religiosamente, fazendo promessa, simpatia, participando da quadrilha da festa junina. Isso é muita ingratidão! Santo Antônio se tornou tão relapso para com o seu povo que estamos indignados! Daqui, só um ou outro foi agraciado pelo tal, mas a grande maioria foi largado às traças, na guerreirice nossa de todo fim de semana. Nem Papai Noel esquece assim da gente, nem mesmo quando não somos bons meninos! E aposto que aquela pessoa da musiquinha junina também não foi correspondida*!

Ah, mas esse ano vai ser diferente... na sexta-feira, será inaugurada a "Milícia dos torturadores de Santo Antônio". Profissionais capacitados, treinados e devidamente armados para maltratar a vítima, utilizando-se de técnicas de tortura provenientes da Ditadura Militar. Só botar o santinho de castigo, virado para a parede, não vem dando resultados? Venha para a milícia você também! E por acaso é só polícia ou político que pode maltratar o povo? Nós também não somos filhos de Deus?? Também temos o direito! Juntem-se a nós!

E chega de Santo Antônio apenas de cabeça pra baixo! Agora é guerra! No mínimo, pendurado pelos pés, de cabeça pra baixo dentro de um aquário cheio de material inflamável, com fogo em volta. Ou então fazer à lá Nardoni e ameaçar jogar o coitado pela janela, que tá na moda. Dessa ele não escapa! E aposto que, frente a tanto desespero, até São João vai se sensibilizar com a nossa causa!



*"Eu pedi numa oração
Ao querido São João
Que me desse um matrimônio
São João disse que não!
São João disse que não!
Isto é lá com Santo Antônio!
Eu pedi numa oração
Ao querido São João
Que me desse um matrimônio
Matrimônio! Matrimônio! (lá lá lá lá)
Isto é lá com Santo Antônio!

Implorei a São João
Desse ao menos um cartão
Que eu levava a Santo Antônio
São João ficou zangado
São João só dá cartão
Com direito a batizado
Implorei a São João
Desse ao menos um cartão
Que eu levava a Santo Antônio
Matrimônio! Matrimônio! (lá lá lá lá)
Isso é lá com Santo Antônio!

São João não me atendendo
A São Pedro fui correndo
Nos portões do paraíso
Disse o velho num sorriso:
Minha gente, eu sou chaveiro!
Nunca fui casamenteiro!
São João não me atendendo
A São Pedro fui correndo
Nos portões do paraíso
Matrimônio! Matrimônio! (lá lá lá lá)
Isso é lá com Santo Antônio!"

Se dessa vez não der certo, gente, sinto muito, mas o nosso fim é no convento!


Notas:
- É ÓBVIO que não é pra me levar a sério, não precisava nem desse p.s. aqui! hahauha