dimanche, décembre 23, 2007

Jura de morte.

Deixo aqui registrado com minhas palavras que um dia eu inda hei de mata-lo, galo desgraçado. Você não tem hora, seu relógio biológico está errado! Cantas a noite inteira, não tens pena de ninguém, o sol mal se põe e tu ja te pões a cantar. Estás cantando pro sol que nasce no Japão, é? Galo desgraçado, estás no lado do mundo errado, também não terei pena de ti. Te arrancarei pena por pena, sem dó, as azuis, as negras, as vermelhas, ficararás depenado, nuzinho, pelado, aí quero ver você posar de bonitão pras galinhas do quintal. É, porque posas como se fosse o Rei do Galinheiro, e ainda acha que canta muito bem, não é? Não deve haver, no mundo, galo mais pretencioso. E ainda ousa cantar no ritmo! O tempo que tapo os ouvidos é marcado pelo (des)compasso do teu cocoricó. Dá meia noite, ele estufa o peito e começa sua cantoria maldita, como se um sol, à meia noite, estivesse prestes a nascer. Galinho sem jeito! Sonho contigo toda vez que durmo aqui. Quando dou um jeito de abstrair sua infeliz existência, tentando adormecer num sono quase profundo, daqueles que a gente inventa o roteiro do sonho ao fechar os olhos, você invade a minha mente, entrando pelos meus ouvidos, e bem na hora que o príncipe encantado vem pra me beijar, ele se transforma em galo e começa a cacarejar. Isso é crime! É invasão de privacidade, invasão de intimidade. Te processaria, se eu pudesse. Um dia ainda vais encontrar veneno no teu milho, armadilhas no teu puleiro, vou te fazer sofrer, vais pagar por cada noite aqui mal dormida, vou colar teu bico com superbonder, costura-lo, amarra-lo, pendurar-te pelos pés de ponta a cabeça, até você aprender que galo só canta ao amanhecer. Isso só pode ser problema de insônia, vá se tratar e não venha mais encher meu saco. Se quiser ver o sol nascer denovo, vá cantar de galo em outra vizinhança, senão vai parar pelado na panela, e vou trocar o perú por você na ceia de Natal, está entendido? Leia com atenção, letra por letra, galo maldito, este é meu ultimato. Te dou até minha proxima visita à Saquarema pra você atorodoar em outro lugar, de preferência, bem longe da casa da minha avó. E tenho dito












Notas:
- Galos não sabem ler, droga. ;\

jeudi, décembre 20, 2007

Diálogo

"— E você, por que desvia o olhar?

(Porque eu tenho medo de altura. Tenho medo de cair para dentro de você. Há nos seus olhos castanhos certos desenhos que me lembram montanhas, cordilheiras vistas do alto, em miniatura. Então, eu desvio os meus olhos para amarra-los em qualquer pedra no chão e me salvar do amor. Mas, hoje, não encontraram pedra. Encontraram flor. E eu me agarrei às pétalas o mais que pude, sem sequer perceber que estava plantada num desses abismos, dentro dos seus olhos.)


— Ah. Porque eu sou tímida."

(Rita Apoena)
Sujeitinho atrevido. Nasce assim sem pedir licença. Anda pelas ruas sem dar maiores explicações. Respira por aí impunemente. Quem ele pensa que é pra passar a existir assim sem mais nem menos? Não permito. Nem adianta chegar assim trazendo o sol pelo braço, com esse sorriso pendurado no rosto. Não, não permito que me invada assim feito brisa, com tanta leveza. Eu, que tenho o peso de tantas culpas, nunca conseguirei flutuar para acompanhá-lo, não vê? Sou noite sem lua, feita de matéria densa e escura, não posso conviver com tanta claridade. Por que insiste tanto em me amanhecer? Em mim nunca houve aurora, escutou? Não, claro que não, banhado em música, como haveria de perceber o silêncio em que me afogo? Por que insiste tanto em me resgatar? Por que chega de mansinho e me põe a bailar quando tudo o que eu queria era findar? E esses pés, que fazem eles, que não me respeitam mais e o acompanham como se tivessem sempre sido seus? Os olhos fecham-se, agora, e a ousadia da sua imagem escorrega, anguidamente, banhando-me de uma calmaria que abala o meu descompasso. Como se atrevem, você e essas partes todas de mim? Amor atrevido! Nasce assim, sem pedir licença! Corre pelas minhas artérias e veias, marcando território por todo o meu corpo. Nada mais me pertence. Meus sonhos, meus medos, as coisas que sou e não sei, as coisas que quero e não fui. Tudo agora parece mais leve, mais colorido, mais surreal. Como posso impedir o inevitável se já não sou o que era momentos atrás? Se agora, o que mais quero é deixar que o sol me carregue pelo braço, flutuando numa dança sensual, que me embota os sentidos e penetra as minhas entranhas, até que um novo dia aconteça.

(Texto da Maíra Viana - levemente adaptado.)

mercredi, décembre 19, 2007

Caminhando e cantando e seguindo a canção.

O verão ligou avisando que está a poucos dias de chegar em nossa cidade. Ele vem quente, bem quente, prometendo dias de sol escaldante, algumas tempestades de fim de tarde, e um calor no coração que não é sentido faz tempo. Ele quer fazer jus ao nosso título de 'Rio 40 graus', e quem sabe, bater seus proprios recordes.
Enquanto isso, a primavera, com ar de despedida, arruma suas malas, vai fazer uma viagem ao hemisfério norte mas só deve chegar lá em alguns meses (é que ela vai de onibus convencional pelo continente, e se tiver que atravessar o oceano, o fará de canoa, pra economizar e chegar rica ao seu destino). Quem aproveitou sua estadia por aqui, com certeza só estava pensando no.. projeto verão! Injusto? Pobre primavera.. tão bonita, mas sempre menosprezada porque precede a estação dos brasileiros.
Muito condecendente com o caso da primavera, eu passei essa estação inteira só pensando nela, nas flores, na brisa, e esqueci do projeto verão. Esqueci mesmo. Meus amigos já não aguentam mais minhas promessas primaveris de que "no próximo verão vocês não vão nem me reconhecer, de tão boa que eu vou estar". Este próximo verão que nunca chega. Tomei sorvetes, bebi cervejas, comi besteiras à noite. E.. estou uma bela bolinha. Uma bela bolinha fora dos padrões que não poderia jamais caminhar por itaquatiara desfilando suas curvas.
Para amenizar, corro atrás do prejuizo. Literalmente. E que delícia é caminhar! Niterói tem uma orla tão extensa e tão gostosa, ainda que fedorenta, privilegiada com a vista pro Rio e com a tranquilidade da qualidade de vida que os índices nos dizem ter. Pego ali, desde o centro de Niterói, aonde tem as Barcas e o Caminho Niemayer, e vou até a estrada Fróes.
Tênis, short, camiseta, filtro solar, fone no ouvido e pronto. Saio caminhando e cantando pelo calçadão afora. Não sei se é o vento no rosto, a musica no ouvido, o sol ou a paisagem, não sei se sou eu fazendo charme para mim mesma, ou se é o pensamento que fica mais leve a cada passo dado, nessas horas que, por estar feliz, a gente se sente mais singelo e se perdoa quase tudo. O trajeto é o mesmo, mas todo dia me deparo com algo diferente, um rosto novo na rua, outras passadas que por mim passam velozes, outro jeito do mar bater nas pedras. As tardes pintadas a dedo me mostram um quadro que merece ser visto todos os dias. Hoje não pelo corpo, mas caminho pela mente. Alivio tensões, não ligo pro horário, e canto alto sem me importar com os ouvidos alheios.
Me despeço da primavera beijando seus ventos. E novos ventos sopram por aqui. Ventos que abrem o caminho pro verão chegar, aquecer o coração e, ainda que não possa desfilar por itaquatiara, avise-o que irei visita-lo todo santo dia. E irei a pé.